Foto de uma banana selvagem
O
mais burlesco de algumas pessoas de religião secular, ou do movimento da Nova Era, na tentativa de naturalizar o
homem, é quando é quando elas alegam ao morder uma banana e descascar uma laranja (apesar de usarem faca), que a casca é uma
"embalagem natural", então agradecem escrupulosamente a
natureza por ter sempre sido farta, ao enaltecer a ideia
do "Um" com a natureza o velho mito do bom-selvagem: o de
não tirar nada além do que consome, porque, para eles, a natureza
já é suficientemente boa, bela e abundante.
Eles se veem
integrados a esse ciclo natural de renovação da cadeia alimentar -
como se fossem mais um animal - no entanto, poucos sabem que a banana sem
sementes, doce, carnuda e simples de descascar, é
produto da técnica humana; ou seja, da seleção artificial
criteriosa ao longo de gerações desde a pré-história; dessa mesma
forma, também são as demais frutas tal como as conhecemos e
consumimos; sendo que jamais existem na natureza como frutas silvestres para
serem apanhadas. É evidente que o mesmo serve para a faca que as descascam (ao menos
sendo isso óbvio a todo homem).
Por um viés
material-dialético, o homem não é nada sem mexer, bulir, revirar a
natureza e, tampouco alguma vez abandonou a pretensão de estar além do animal ao nu e ao cru. Com efeito, a
natureza sempre pareceu escassa de alguma maneira a ele,
justamente daí que vem a intenção de acrescentar "algo".
Só o homem é capaz de produzir fogo e dormir suspenso no ar, longe
de sanguessugas e insetos hematófagos nos pântanos; e do mesmo modo,
produzir átomos de elementos que jamais existiriam na natureza
disponível; que é mais uma maneira de usar o fogo.
Enquanto
a natureza continuar escassa à vontade humana, o homem vai
permanecer criativo fazendo o que sabe fazer de melhor: "alterá-la; e é com a força do trabalho que o homem empenha-se para alterá-la; digamos que é o mais básico em toda a finalidade material da vida humana. Por mais que no fundo a alteração e a transformação se permita
somente em certo sentido estrito, mais precisamente, de forma
implosiva e interna à consciência do homem. Isto é, uma transformação pertencente a uma
realidade simbólica própria do que é viver, ao passo que essa permitiria ao homem
somente existir "per se" para ele mesmo e não para outra
realidade; por exemplo: o que é tudo aquilo que simboliza uma
"casa"; uma "faca"; uma "fogueira"; o
"martelo"; o "arado" para este homem; enquanto
que a natureza, também "per se", fora dessa realidade
simbólica humana, jamais mudaria de forma veras, ou, alguma vez,
poderia essa ser reduzida ao conhecimento humano, sem estar disposta enfaticamente a apenas sua representação misteriosa e emblemática; urgindo-se de forma distinta de todos os objetos da técnica,
destarte, inadiável e atemporal.
Como Emerson a entende em
seu ensaio de mesmo nome chamado "Natureza"; assim ele
diz: "Natureza, em seu sentido comum, refere-se as essências
não modificadas pelo homem: o espaço, o ar, o rio, a folha".
Por outro lado, ele define a "arte", ou se preferir,
"técnica", em algo que vejo como a representação, isto é, a
imagem do objeto (natureza) pela mesma via que essa imagem é a realização do espírito do humano: "Arte
se aplica à mescla da vontade do homem com essas mesmas coisas, como
se dá em uma casa, um canal, uma estátua, um quadro". Dado que, Emerson repreende a definição de natureza com um "porém":
"tomadas em conjunto as operações do homem são tão
insignificantes - mera escavação, cozimento, arrumação, lavagem -
que, comparadas a impressão grandiosa que o mundo deixa na mente
humana, em nada alteram o produto".
Assim, é possível interpretar e averiguar que a diferença
fundamental da natureza e do homem é que, enquanto a primeira, a saber o objeto, se encontra determinado substancialmente na realidade; o segundo (o homem) se
permite a acontecer num dasein (ser aí); isto é: estar
presente - tal que é o existir da maneira mais profunda no que Heidegger assente por existência: tanto pela via da mudança quanto pela via
da não mudança, ou da via do ser e da falta dele, da via da
substância e da contingência, da mente e do corpo, do natural e do
sintético, ou mesmo da via do indeterminado enquanto determinado, o
homem sendo o que existe pelo ser posto unicamente no presente.
E o
trabalho humano, apesar de um ciclo de transformação, e parecendo querer ser uma corrupção do que já é determinado no mundo natural, é
um processo elementar, eu diria, além de água, fogo, terra e ar,
como os alquimistas disporiam: o "quinto elemento" ou a quintessência, pela busca de
vir a ser do homem, a manipulação de todos os demais elementos.
Talvez, todo esse ensaio, foi da justa pretensão em dizer que a
natureza é mais doada para o homem, do que a essência do homem é para ela, dessa forma, estando ele sujeito a sua própria história, conjuntamente à técnica. O homem se doa para si mesmo e não
para a natureza, que ultrapassa seu semblante temporal; sendo que no tempo ele consegue se fazer como eixo
central da realidade representativa; essa que é a sua mesma.
Por Marcelo Monteiro